A pesquisa científica sobre as algas marinhas é grande aliada da indústria da maricultura que vem crescendo vertiginosamente nos últimos anos, com destaque para as algas vermelhas.

O ágar-ágar é um pó gelificante que tem ganhado popularidade como alternativa vegana à gelatina, mas que tem sido utilizado em microbiologia como substrato de crescimento bacteriano há décadas. É um polissacárido análogo à pectina (das cascas de fruta) exclusivo de um grupo específico de algas marinhas vermelhas, as agarófitas. Ao contrário da gelatina, que é constituída por aminoácidos, este fitocolóide é um polímero de galactose (o mesmo que se encontra no leite) com propriedades químicas únicas, o que lhe confere diversas aplicações terapêuticas e biotecnológicas 1,2. É uma excelente fonte de fibras para o consumo humano e forma uma espécie de geleia mais consistente que a gelatina à temperatura ambiente. Poucas espécies de agarófitas acumulam ágar suficiente para exploração econômica, mas muitas iniciativas de “agricultura marinha”, ou maricultura, estão criando linhagens com maior rendimento de ágar, o que pode fomentar uma indústria bilionária 3. O Brasil tem desenvolvido alguns estudos nesse campo, inclusive no Nordeste, onde sua biomassa é abundantemente encontrada nas regiões entremarés 4.
"As algas vermelhas são indicadoras de qualidade da água e podem abrigar diversas outras espécies marinhas, além de serem uma boa fonte de energia para mamíferos, peixes, moluscos e crustáceos"
No litoral de São Luís, no Maranhão, pelo menos 11 espécies de agarófitas são encontradas presas a pedras e areia em poças de maré 5,6. Entretanto, estudos de ecologia e taxonomia dessas espécies ainda são escassos, o que pode significar uma subestimação de sua biodiversidade 7. Elas são indicadoras da qualidade da água e podem abrigar diversas outras espécies marinhas, além de serem uma boa fonte de energia para mamíferos, peixes, moluscos e crustáceos 8-10. Portanto, a preservação dos ambientes rochosos nas praias de São Luís deve ser uma prioridade das instituições ambientais a partir da produção de conhecimento científico e da conscientização dos visitantes desses locais, uma vez que a grande amplitude da maré local permite o fácil acesso às pedras onde eles se encontram.

Há um enorme risco de se perder um valiosíssimo patrimônio genético, ambiental e ancestral caso não tomemos alguma atitude para preservá-las. Há registos fósseis de algas vermelhas com mais de 1,2 mil milhões de anos 11 e, por isso, detém uma grande diversidade morfológica, fisiológica, genética e química. Essas algas respondem a uma longa adaptação às grandes alterações do clima terrestre, o que lhes permitiu também distribuir-se desde os trópicos até aos pólos e mesmo em ambientes extremos com elevada acidez e temperatura (pH <3; Temperatura = 45ºC) 12. No entanto, o impacto das alterações climáticas antropogénicas reduziu consideravelmente a sobrevivência destes verdadeiros fósseis vivos do reino vegetal 13,14. Existe um risco enorme de perder um património genético, ambiental e ancestral muito valioso se não tomarmos medidas para o preservar.


O IBPBio sabe que as algas vermelhas são muito importantes para o nosso litoral e já está planejando um levantamento dos principais pontos de ocorrência dessas espécies na ilha de São Luís, a fim de mapear o potencial de preservação e também de geração de renda a partir da maricultura desses fantásticos organismos. O mercado de gelatina vegana marinha ainda pode crescer muito no Brasil e pode ser um ator fundamental para a conservação da biodiversidade da costa do país. Também temos parcerias com vários grupos de pesquisa (UFSC, USP) para desenvolver projetos que visam entender como e quando as algas Sargassum irão reaparecer em nossa costa.
Quer saber mais sobre esse post e outros projetos do IBPBio relacionados ao mar, entre em contato com a gente.
Fontes: 1. Silva, T. H. et al. Marine algae sulfated polysaccharides for tissue engineering and drug delivery approaches. Biomatter 2, 278–289 (2012). 2. Cardozo, K. H. M. et al. Metabolites from algae with economical impact. Comp. Biochem. Physiol. Toxicol. Pharmacol. CBP 146, 60–78 (2007). 3. Oliveira, E. C., Alveal, K. & Anderson, R. J. Mariculture of the agar-producing gracilarioid red algae. Rev. Fish. Sci. 8, 345–377 (2000). 4. Rebours, C. et al. Seaweeds: an opportunity for wealth and sustainable livelihood for coastal communities. J. Appl. Phycol. 26, 1939–1951 (2014). 5. Ferreira-Correia, M. M. et al. Macroalgas. in Biodiversidade Marinha da Ilha do Maranhão 208 (2013). 6. Ferreira-Correia, M. M., Lopes, M. J. S. & Brandão, M. do desterro S. Levantamento das algas marinhas bentonicas da ilha de São Luis (estado do Maranhão, Brasil). Bol. Laboratório Hidrobiol. 1, 23–46 (1977). 7. Faria, A. V. F., Martins, N. T., Ayres-Ostrock, L. M., Gurgel, C. F. D. & Plastino, E. M. Phylogeography of the red alga Gracilariopsis tenuifrons (Gracilariales) along the Brazilian coast. J. Phycol. (2023) doi:10.1111/jpy.13363. 8. Bermúdez, Y. G., Rico, I. L. R., Bermúdez, O. G. & Guibal, E. Nickel biosorption using Gracilaria caudata and Sargassum muticum. Chem. Eng. J. 166, 122–131 (2011). 9. Barrington, K., Chopin, T. & Robinson, S. Integrated multi-trophic aquaculture (IMTA) in marine temperate waters. FAO Fisheries and Aquacuture Paper (2009). doi:10.1016/S0044-8486(03)00469-1. 10. Cruz-Rivera, E. & Friedlander, M. Feeding preferences of mesograzers on aquacultured Gracilaria and sympatric algae. Aquaculture 322–323, (2011). 11. Gibson, T. M. et al. Precise age of Bangiomorpha pubescens dates the origin of eukaryotic photosynthesis. Geology (2017) doi:10.1130/G39829.1. 12. Rademacher, N. et al. Transcriptional response of the extremophile red alga Cyanidioschyzon merolae to changes in CO 2 concentrations. J. Plant Physiol. (2017) doi:10.1016/j.jplph.2017.06.014. 13. Harley, C. D. G. et al. EFfects of climate change on global seaweed communities. Journal of Phycology vol. 48 (2012). 14. Kinnby, A., White, J. C. B., Toth, G. B. & Pavia, H. Ocean acidification decreases grazing pressure but alters morphological structure in a dominant coastal seaweed. PLoS ONE 16, (2021).